quarta-feira, 24 de setembro de 2008

Descida do Sena: tarefa cumprida!

Bonjour Brasil!

Chegamos ao final de nossa viagem por dentro da verdade do Rio Sena. No início, flagramos o momento em que as primeiras gotas de água se juntam para formar a nascente deste grande rio. E agora, estamos aqui diante deste mundo de água doce que se entrega ao Oceano Atlântico.

Na margem esquerda da foz do Sena está situada a graciosa Honfleur, uma das cidades portuárias mais antigas da Normandia. Vários capítulos importantes da história da navegação mundial tiveram esta pequena cidade como seu ponto de partida.

Do outro lado está Le Havre, cujo porto abriga algumas das atividades industriais mais expressivas da bacia.

Ligando os dois lados do rio foi construída, em 1995, a Ponte da Normandia, uma bela obra de engenharia, com restaurante, mirante e passagem para pedestres.

Estamos na região que acaba concentrando todos os despejos que são lançados no Sena. É uma das áreas mais monitoradas de toda a bacia hidrográfica.

Aqui foi criada, há oito anos a Reserva Natural Nacional do Estuário do Sena. Espremendo-se no meio de uma dos trechos mais antropizados de toda a bacia, a reserva é o abrigo natural de inúmeras espécies de aves migratórias. Os pequenos riachos preservados no entorno da reserva são também pontos de acasalamento e nidificação de várias espécies de peixes.

Um dos coordenadores da Reserva é Christophe Bessineton, oceanógrafo francês que já morou durante oito meses no Brasil. É ele quem nos explica os maiores desafios e contradições da reserva, inclusive o fato dela abrigar locais específicos para a prática de caça aos patos selvagens.

Mesmo com todos os problemas existentes ninguém desconhece a importância de que exista uma reserva natural justamente no estuário do Sena. É o local onde os ambientes de água doce e salgada se encontram. É onde se encontram também as espécies típicas destes ambientes. É, por fim, um local ainda bastante estratégico para a indústria naval francesa, com inúmeras demandas de ampliação de suas atividades.

A persistência da reserva em ambiente tão disputado, de certo modo, serve como símbolo de toda a situação que pudemos observar no Sena ao longo destes 10 dias de descida.

A presença humana no território francês é contada em milhares de anos. Os impactos das atividades econômicas vem se acumulando há bastante tempo. As preocupações ambientais, por sua vez, são um tema muito recente, contado em poucas dezenas de anos.

As marcas deixadas por centenas de anos de atividades predatórias podem ser sentidas ainda hoje. Os sedimentos encontrados em camadas mais profundas de areia da foz do Sena dão o testemunho da existência de substâncias nocivas que embora tenham sido banidas pela legislação recente de controle ambiental, continuam a produzir efeitos adversos.

Este talvez seja um bom retrato dos desafios que se colocam diante da política de recursos hídricos da França. Depois de passar os últimos 40 anos combatendo as fontes de poluição mais comuns, como os despejos industriais e os esgotos domésticos, que eram lançados sem tratamento nos corpos d’água, a legislação francesa conseguiu controlá-las.

Nem tudo está feito, é claro, como reconhecem as próprias autoridades ambientais francesas, mas a situação melhorou tanto que hoje eles podem se dar ao “luxo” de preocupar-se com a “poluição fóssil”, ou seja, aquela se acumulou durante as centenas de anos de ausência de preocupações ambientais.

Mesmo sabendo que a França se preparou de modo mais adequado que o Brasil para defender os seus recursos hídricos, e mesmo reconhecendo a enorme diferença de condições estruturais para levar à frente este desafio, não deixamos de encontrar parentesco nas atitudes e nas mentes que aqui na França e aí no Brasil batalham por uma esperança de futuro.

Deste modo, as dificuldades estruturais que nossa equipe enfrentou para estar aqui na França, ao invés de nos diminuir diante de quem quer que seja, antes realçam nosso espírito combativo e interessado de fazer com que o Brasil tenha uma política de recursos hídricos à altura das suas responsabilidades como país que detém as maiores reservas de água doce do planeta.

Até breve, Brasil!

Nossos sinceros agradecimentos à professora Zanete Dadalto, autora de todas as fotos desta descida do Sena, ao cinegrafista Secundo Rezende e à Zoom Produções, pela coleta de imagens feitas durante à descida, aos colegas franceses Claude Le Gouill e Tangi Le Boulanger, que nos guiaram e conduziram durante esta jornada, e ao Instituto Ecobacia, que patrocinou a viagem acreditando na sua importância para o aprimoramento da gestão de recursos hídricos no Brasil.


Alberto Pêgo
Presidente do Instituto Ecobacia

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